Henrique Cabral: learn to fly

30 November 2008





Magalhães e os coletes de trânsito

Há em Portugal, periodicamente, fenómenos deveras intrigantes, pela adesão que suscitam, verdadeiramente em massa, por parte dos portugueses.

Há poucos anos atrás, foram os coletes de trânsito. Enquanto em Espanha ou no Reino Unido foram necessárias campanhas complicadíssimas, se acenderam discussões filosóficas sobre o tema e a questão não está ainda resolvida, em Portugal apenas foi necessário acenar com ameaças de vigilância apertada por parte da Brigada de Trânsito da GNR e com multas a quem ousasse parar à beira da estrada, para fumar um simples cigarro, sem vestir de imediato o respectivo coletinho verde e pronto, está feito, toca a correr encomendar a novidade.

Foi de tal forma que gasolineiras, hipermercados, lojas de conveniência, todos participaram no grande desígnio nacional que foi dotar cada português do seu colete de trânsito.

Assim foi até esgotarem.

Pois bem, o actual desígnio é o Magalhães. "I have a dream", he said ... Sonho com o dia em que todos os portugueses possam navegar pelo Mundo, assim como Magalhães fez há mais de 500 anos, quando partiu para a sua volta de circum-navegação, em busca das Índias pelo lado oposto ao habitual, que é como quem diz, ao contrário. Não sei se estão exactamente a par mas Magalhães nunca haveria de descobrir as Índias, acabando mesmo por atirar as cartas de navegação que então dispunha borda fora porque depois do estreito que haveria de vir a chamar-se Magalhães em sua homenagem, todo o grande mar que era o Pacífico estava mal descrito.
Como Magalhães, também os portugueses deverão um dia poder navegar livremente, cada um agarrado ao seu portátil, sem saberem exactamente qual o seu destino (de resto, como hoje fazem, navegam sem rumo e assim é que é bom).

Tal como com os coletes, também agora a histeria colectiva tomou conta dos portugueses, que acorreram em massa ao seu Magalhães.

Tal como aconteceu com os coletes, também os Magalhães esgotaram.

A história repete-se.

José Sócrates está pois, bem aconselhado. Os seus sábios conselheiros sabiam que, lançada uma novidade do tipo colete, os portugueses tratariam de se mobilizar, num sinal do magno respeito pelo grande líder. E portanto Sócrates poderia apostar num desígnio do tipo computador a seu dono porque isso lhe permitirá, cada vez mais, recolher impostos via internet. Terá sido ainda Macedo quem lhe segredou ao ouvido a estratégia: "Depois de um PC na mão de cada português, não haverá um único que possa dizer que não pagou os impostos porque não tinha internet em casa...".

Depois do Congresso do PC(P) deste fim de semana, no Campo Pequeno, e de tantas mãos no ar, suponho que o aviso de Macedo não queria exactamente dizer que dentro em breve teríamos um PC na mão de cada português mas um português com uma mão no PC (ou um pé....). De colete vestido, pois claro!
Toca a mobilizar!



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